Esses são os procedimentos que estão “em tramitação”, porque no ano em que assumiu, mas precisamente no mês de agosto de 2021, Pacheco rejeitou, de plano, a petição do Ex-Presidente Bolsonaro contra Alexandre de Moraes.
Desses 47 pedidos, Xandão lidera disparado com 22 processos.
O último pedido foi protocolado em março deste ano, contra o então recém empossado, Flávio Dino – que assumiu o cargo em fevereiro. Nesse verdadeiro oceano de solicitações de impeachment que Pacheco vem jogando para debaixo do tapete, criminosamente, um chama a atenção por sua diferença dos demais: é contra todos os ministros da Suprema Corte.
É de competência exclusiva do Senado processar e julgar os pedidos de impeachment desses Ministros – e o entendimento é de que cabe ao presidente da casa, que comanda a Mesa Diretora, proceder a um juízo de admissibilidade da petição. Uma vez “admitido”, é submetido ao plenário, mas se rejeitado – é encerrado e arquivado, como o Pacheco fez com a petição do Bolsonaro.
Vamos desmitificar o processo de impeachment no Senado, a começar por esse poder absoluto concentrado nas mãos de Rodrigo Pacheco.
Inicialmente, vale elucidar a população de que não há necessidade de ser Senador da República para apresentar pedido de impeachment: qualquer pessoa do povo pode protocolar uma petição dessa natureza.
Nessa esteira, a pergunta que se faz é: por que a OAB ainda não protocolou um pedido de impeachment contra Alexandre de Moraes?
Ou ainda: por que até agora não se juntou um grupo de juristas renomados para expor no Senado todas essas aberrações jurídicas cometidas pelo Xandão?
Pior é se considerarmos que esses atentados à democracia, ao estado de Direito, aos preceitos constitucionais fundamentais e ao devido processo legal, vêm numa escalada crescente – e a comunidade jurídica não se mexe.
Fechado esse parêntese, vamos ao que interessa – o super poder de Rodrigo Pacheco.
O regimento interno da Câmara dos Deputados dá ao Arthur Lira o poder de aceitar ou rejeitar os pedidos de impeachment contra o presidente da República. Já o regimento interno do Senado não replica esse dispositivo.
Como Pacheco vem atuando?
Ele recebe a petição e, antes de submetê-la à Mesa Diretora, despacha para a “advocacia da casa” (segundo suas próprias palavras) dar seu parecer – e para por aí. Nunca submete ao plenário.
Como Pacheco deveria atuar?
Pavinatto foi brilhante ao verificar que, no Senado, vale a Lei 1.079 de 1950. Dessa forma, o rito é bem diferente daquele adotado pelo presidente da casa.
Um único senador pode protocolar um pedido de impeachment. Na sessão seguinte ao protocolo, a Mesa Diretora é obrigada a proceder à leitura integral do documento. Não há debates orais – e automaticamente se institui uma comissão para, aí sim – confeccionar um parecer em, no máximo, dez dias.
Juntado o parecer, na sessão seguinte esse documento é lido para todos e, na sessão subsequente a leitura, realizam-se os debates e a votação aberta, no plenário.
Se Rodrigo Pacheco, como presidente da Mesa Diretora, não ler o parecer, o senador que protocolou o pedido pode recorrer à Comissão de Constituição e Justiça da Casa, se entender que essa omissão é uma forma de prejudicar o impeachment.
Nesse caso, o CCJ decide se esse parecer vai ser lido ou não (recurso previsto art. 48, inciso 11 e art. 334, § 2º, do Regimento Interno do Senado Federal).
Se o entendimento dos senadores for de que não cabe recurso na decisão de Pacheco (da “não leitura” do parecer), pode ser dada voz de prisão em flagrante delito ao presidente e todos os demais membros integrantes da Mesa Diretora, por crime de prevaricação – art. 319 do Código Penal.
Porém, a verdade é a seguinte: os autos são lavrados pela Polícia Legislativa, que encaminha para a PGR. O Procurador Geral pode arquivar, se entender que não há crime, mas Pacheco ficará 24 horas detido. Se denunciado, por ter foro privilegiado, responderá ao crime no STF – e já sabemos qual será o resultado.
Contudo, na sessão seguinte à sua detenção, dá-se novamente voz de prisão ao presidente da Casa, por mais uma vez não ler o parecer. Uma hora esse sistema de mútua proteção enfraquece seus alicerces e desaba.
É possível dar nova voz de prisão sim. Prevaricação é crime formal, ou seja, ele se consuma com a omissão, retardo ou prática de um ato de ofício, independentemente do resultado naturalístico. O crime praticado na sessão anterior se exauriu ali. A omissão na sessão seguinte é um novo crime.
Está dado o caminho das pedras para que desmorone essa muralha de proteção mútua entre o presidente do Senado e os ministros do STF.
Carlos Fernando Maggiolo
Advogado criminalista e professor de Direito Penal. Crítico político e de segurança pública. Presidente da Associação dos Motociclistas do Estado do Rio de Janeiro – AMO-RJ.
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