PGR “escondeu” falas de Mauro Cid que divergem de denúncia Órgão não elencou no documento algumas falas do militar que contrariam versão da acusação
Paulo Moura - 21/02/2025 12h08 | atualizado em 21/02/2025 12h52
Mauro Cid Foto: Alan Santos/Presidência da República
Ao formalizar nesta semana a denúncia contra o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) por suposto golpe de Estado, a Procuradoria-Geral da República (PGR) deixou de fora algumas falas do tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro, que indicam um claro contraste com a acusação feita contra o líder conservador.
Desde que firmou o acordo de delação, em setembro de 2023, Mauro Cid teve muitas idas e vindas em suas declarações. Ele chegou a relatar a interlocutores, inclusive, que teria sido pressionado a relatar episódios que não aconteceram. Durante as investigações, ele chegou mudar sua versão após ser ameaçado de prisão pelo ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal.
Entre os pontos controversos da fala de Cid, que não são sequer citados pela Procuradoria-Geral da República na denúncia, estão o fato de que Bolsonaro teria tomado conhecimento do plano Punhal Verde e Amarelo, que incluiria a morte do ministro Alexandre de Moraes e da chapa presidencial eleita, Lula (PT) e Geraldo Alckmin (PSB).
Enquanto a PGR diz que Bolsonaro sabia do plano e o autorizou, Mauro Cid disse não saber se Bolsonaro sequer tomou conhecimento do documento de elaboração da ideia. A declaração do ex-ajudante de ordens do líder conservador, porém, foi ignorada na denúncia.
– Eu não tenho ciência se o presidente sabia ou não do plano que foi tratado, do Punhal Verde Amarelo, e se o general Mário [Fernandes] levou esse plano para ele ter ciência ou não – disse Cid, em depoimento dado à PF em dezembro.
Para justificar a acusação, a PGR citou uma troca de mensagens entre Cid e o general Mário Fernandes, na qual Fernandes fala de uma conversa com Bolsonaro, que teria dito que “qualquer ação” poderia ocorrer até 31 de dezembro. O órgão, porém, não trouxe o contraditório do ex-ajudante de ordens presidencial.
MONITORAMENTO DE MORAES
Outro ponto polêmico omitido pela PGR é sobre o monitoramento do ministro Alexandre de Moraes. Na denúncia, o órgão destaca que a delação de Cid aponta que Moraes teria sido monitorado duas vezes, uma a pedido de militares que fariam parte do grupo operacional do Punhal Verde Amarelo e outra a pedido de Bolsonaro.
O que o documento da PGR não cita, porém, é que, na versão de Mauro Cid, Bolsonaro pediu o monitoramento não no contexto da operação de assassinato, mas porque estaria irritado por ter recebido a informação de que Moraes estaria se encontrando com o seu vice, o hoje senador Hamilton Mourão (Republicanos-RS).
“BATE-PAPO DE BAR”
A PGR também incluiu na denúncia uma referência a uma reunião de militares em Brasília, no dia 28 de novembro de 2022, que supostamente trataria da elaboração de uma carta interna que teria o objetivo de pressionar o comandante do Exército, Marco Antônio Freire Gomes, a aderir o suposto golpe.
A PGR, porém, não incluiu a versão de Cid na qual o ex-ajudante de ordens diz que, no encontro, não se discutiu nenhuma medida específica no sentido do suposto plano, mas se resumiu a um “bate-papo de bar” de militares que estavam inconformados com a derrota eleitoral.
– Naquele momento ninguém botou um plano de ação, é esse ponto que eu quero deixar claro, ninguém chegou com um plano e botou um plano na mesa e falou assim: “Não, nós vamos prender o Lula, nós vamos matar, nós vamos espionar” – disse Cid, em depoimento à PF em 19 de novembro.
PARTICIPAÇÃO DE BOLSONARO NO 8 DE JANEIRO DE 2023
Na denúncia, a PGR ainda destacou mensagens de Cid que indicariam que alguma movimentação relativa ao suposto plano de golpe de Estado poderia acontecer mesmo após a posse de Lula.
Entretanto, o órgão omitiu as afirmações do tenente-coronel que, na delação, disse que as mensagens em questão não tinham o sentido interpretado pela PF e que Bolsonaro não planejou os atos de 8 de janeiro de 2023.
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